Arthur W. Pink (1886-1952) foi um dos autores evangélicos mais
influentes da segunda metade do século XX. Erudito bíblico de persuasão
reformada e puritana, Pink escreveu várias obras literárias e pastoreou
diversas igrejas nos EUA, além de ter servido como ministro na Inglaterra e
Austrália.
Uma das mais infelizes e trágicas características de nossa civilização é
a excessiva desobediência aos pais da parte dos filhos, quando menores, e a
falta de reverência e respeito, quando grandes. Infelizmente, isto se evidencia
de muitas maneiras, inclusive em famílias cristãs. Em nossas abundantes viagens
nestes últimos trinta anos, fomos recebidos em muitos lares. A piedade e a
beleza de alguns deles ainda permanecem em nossos corações como agradáveis e
singelas recordações. Outros lares, porém, nos transmitiram as mais dolorosas
impressões. Os filhos obstinados ou mimados não apenas trazem para si mesmos
perpétua infelicidade, mas também causam desconforto para todos que se
relacionam com eles e prenunciam coisas ruins para os dias vindouros.
Na maioria dos casos, os filhos são menos culpados do que seus pais. A
falta de honra aos pais, onde quer que a achemos, deve-se em grande medida aos
pais afastarem-se do padrão das Escrituras. Atualmente, o pai imagina que cumpre
suas obrigações ao fornecer alimento e vestuário para os filhos e,
ocasionalmente, ao agir como um tipo de policial de moralidade. Com muita
frequência, a mãe se contenta em desempenhar a função de uma criada doméstica,
tornando-se escrava dos filhos, realizando várias tarefas que estes poderiam
fazer, para deixá-los livres em atividades frívolas, ao invés de treiná-los a
serem pessoas úteis. A consequência tem sido que o lar, o qual deveria ser, por
causa de sua ordem, santidade e amor, uma miniatura do céu, degenerou-se em
"um ponto de parada para o dia e um estacionamento para a noite",
conforme alguém, sucintamente, afirmou.
Antes de esboçarmos os deveres dos pais em relação aos filhos, devemos
ressaltar que eles não podem disciplinar adequadamente seus filhos, a menos que
primeiramente tenham aprendido a governar a si mesmos. Como podem eles esperar
que a obstinação de suas crianças sejam dominadas e controladas as
manifestações de ira, se eles mesmos dão livre curso à seus próprios
sentimentos. O caráter dos pais é amplamente reproduzido em seus descendentes.
"Viveu Adão cento e trinta anos, e gerou um filho à sua semelhança,
conforme a sua imagem" (Gn 5.3). Os pais devem, eles mesmos, viver em
submissão a Deus, se desejam obediência da parte de seus filhos. Este princípio
é enfatizado muitas e muitas vezes nas Escrituras. "Tu, pois, que
ensinas a outrem, não te ensinas a ti mesmo?"(Rm 2.21). A respeito do
pastor ou presbítero da igreja está escrito que ele tem de ser alguém "que
governe bem a própria casa, criando os filhos sob disciplina, com todo o
respeito (pois, se alguém não sabe governar a própria casa, como cuidará da
igreja de Deus?)" (1 Tm 3.5). E, se um homem ou uma mulher não
sabem como dominar seu próprio espírito (Pv 25.28), como poderão cuidar de seus
filhos?
Deus confiou aos pais um solene e valoroso privilégio. Não exageramos ao
afirmar que em suas mãos estão depositadas a esperança e a bênção ou a maldição
e a ruína da próxima geração. Suas famílias são os berçários da Igreja e do
Estado, e, de acordo com o que agora cultivam, tais serão os frutos que
colherão posteriormente. Eles deveriam cumprir seu privilégio com bastante
diligência e oração. Com certeza, Deus lhes pedirá contas referentes à maneira
de criarem seus filhos, que a Ele pertencem, sendo-lhes confiados para
receberem cuidado e preservação. A tarefa que Deus confiou aos pais não é
fácil, em especial nestes dias excessivamente maus. Entretanto, poderão obter a
graça de Deus, se a buscarem com sinceridade e confiança. As Escrituras nos
fornecem as regras pelas quais devemos viver, as promessas das quais temos de
nos apropriar e, precisamos acrescentar, as terríveis advertências, para que
não realizemos essa tarefa de maneira leviana.
Instrua seu filho
Queremos mencionar aqui quatro dos principais deveres confiados aos
pais. Primeiro, instruir seus filhos. "Estas palavras que, hoje, te
ordeno estarão no teu coração; tu as inculcarás a teus filhos, e delas falarás
assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te"
(Dt 6.6-7). Este dever é sobremodo importante para ser transferido aos outros;
Deus exige dos pais, e não dos professores da Escola Dominical, a
responsabilidade de educarem seus filhos. Tampouco essa tarefa deve ser
realizada de maneira esporádica ou ocasional, mas precisa receber constante
atenção. O glorioso caráter de Deus, as exigências de sua lei, a excessiva
malignidade do homem, o maravilhoso dom de seu Filho e a terrível condenação
que será a recompensa de todos aqueles que O desprezam e rejeitam; estas coisas
precisam ser apresentadas constantemente aos filhos. "Eles são pequenos
demais para entendê-las" é o argumento de Satanás, visando impedir os pais
de cumprirem seu dever.
"E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os
na disciplina e na admoestação do Senhor" (Ef 6.4). Temos de observar
que os "pais" são especificamente mencionados neste versículo, por
duas razões: eles são os cabeças das famílias e o governo desta lhes foi
confiado; os pais são inclinados a transferir sua responsabilidade às esposas.
Essa instrução deve ser ministrada através da leitura da Bíblia e de explicar
aos filhos as coisas adequadas à sua idade. Isto deveria ser acompanhado de
ensinar-lhes um catecismo. Um constante falar aos mais novos não se mostra tão
eficiente quanto a diversificação com perguntas e respostas. Se nossos filhos
sabem que serão questionados após ou durante a leitura bíblica, ouvirão mais
atentamente: fazer perguntas os ensina a pensarem por si mesmos. Este método
também leva a memória a reter mais os ensinos, pois o responder perguntas
definidas fixa ideias específicas em nossas mentes. Observe quantas vezes Jesus
fez perguntas aos seus discípulos.
Seja um bom exemplo
Segundo, boas instruções precisam ser acompanhadas de bons
exemplos. O ensino proveniente apenas dos lábios provavelmente será
ineficaz. Os filhos são espertíssimos em detectar inconsistências e rejeitar a
hipocrisia. Neste aspecto, os pais precisam humilhar-se diante de Deus,
buscando todos os dias a graça que, desesperadamente, necessitam e somente Ele
pode dar. Que cuidado eles precisam ter, para que diante de suas crianças não
digam e façam coisas que tendem a corromper suas mentes ou produzam más
consequências, se elas as imitarem! Os pais necessitam estar constantemente
alertas contra aquilo que pode torná-los desprezíveis aos olhos daqueles que
deveriam respeitá-los e honrá-los. Não apenas devem instruir seus filhos no
caminho da santidade, mas eles mesmos devem andar neste caminho, mostrando por
sua prática e conduta quão agradável e proveitoso é ser orientado pela lei de
Deus.
No lar de pessoas crentes, o supremo alvo deve ser a piedade familiar, honrar a Deus em todas as ocasiões, e as outras coisas, subordinadas a este alvo. Quanto à vida familiar, nem o esposo nem a esposa deve transferir para o outro toda a responsabilidade pelo aspecto espiritual da vida da família. A mãe, com certeza, tem a incumbência de suplementar os esforços do pai, pois os filhos desfrutam mais de sua companhia. Se existe a tendência de os pais serem muito rígidos e severos, as mães são propensas a serem muito brandas e clementes; portanto, têm de vigiar mais contra qualquer coisa que enfraquecerá a autoridade do pai. Quando este proibir alguma coisa, ela não deve consenti-la às crianças. É admirável observar que a exortação dada em Efésios 6.4 é precedida por "Enchei-vos do Espírito" (Ef 5.18); enquanto a exortação correspondente em Colossenses 3.21 é precedida por "habite, ricamente, em vós a palavra de Cristo" (v. 16), demonstrando que os pais não podem cumprir seus deveres, a menos que estejam cheios do Espírito Santo e da Palavra de Deus.
Discipline seu filho
Terceiro, a instrução e o exemplo precisam ser reforçados
mediante a correção e a disciplina. Antes de tudo, isto implica no
exercício de autoridade, a correta aplicação da lei divina. A respeito de
Abraão, o pai dos fiéis, Deus afirmou: "Porque eu o escolhi para que
ordene a seus filhos e a sua casa depois dele, a fim de que guardem o caminho
do SENHOR e pratiquem a justiça e o juízo; para que o SENHOR faça vir sobre
Abraão o que tem falado a seu respeito" (Gn 18.19). Pais crentes,
meditem nestas palavras com cuidado. Abraão fez mais do que simplesmente dar
conselhos: ele ensinou com vigor a lei de Deus e ordenou sua casa. As regras
com que ele administrou seu lar tinham o objetivo de seus filhos guardarem
"o caminho do SENHOR", aquilo que era correto aos olhos de Deus. Este
dever foi cumprido pelo patriarca, a fim de que a bênção de Deus estivesse
sobre sua família. Nenhuma família pode crescer adequadamente sem leis
familiares, que incluem recompensas e castigos. Isto é especialmente importante
na primeira infância, quando ainda o caráter moral não está formado e as
crianças não apreciam ou entendem seus motivos morais.
As regras devem ser simples, claras, lógicas e flexíveis, tais como os
Dez Mandamentos, poucas, mas relevantes regras morais, ao invés de centenas de
restrições insignificantes. Uma das maneiras de provocarmos desnecessariamente
nossos filhos à ira é atrapalhá-los com muitas restrições insignificantes e
regras detalhadas e arbitrárias, procedentes de pais perfeccionistas. É de
vital importância para o bom futuro dos filhos que estes sejam trazidos em
submissão desde cedo. Uma criança malcriada representa um adulto ímpio. Nossas
prisões estão superlotadas com pessoas que tiveram a liberdade de seguirem seus
próprios caminhos durante sua infância. A mais leve ofensa de uma criança
quebrando as regras do lar não deve ficar sem a devida correção; pois, se ela achar
clemência ao transgredir uma regra, esperará a mesma clemência em relação a
outras ofensas, e sua desobediência se tornará mais frequente, até que os pais
não tenham mais controle, exceto através do exercício de força brutal.
O ensino das Escrituras é claro quanto a este assunto. "A
estultícia está ligada ao coração da criança, mas a vara da disciplina a
afastará dela" (Pv 22.15; ver também 23.13-14). Por isso, Deus
afirmou: "O que retém a vara aborrece a seu filho, mas o que o ama,
cedo, o disciplina" (Pv 13.24). E, ainda: "Castiga a teu filho,
enquanto há esperança, mas não te excedas a ponto de matá-lo" (Pv 19.18).
Não permita que uma afeição insensata o impeça de cumprir seu dever. Com
certeza, Deus ama seus filhos com um sentimento paternal mais profundo do que
você ama seus filhos, mas Ele nos diz: "Eu repreendo e disciplino a
quantos amo" (Ap 3.19; cf. Hb 12.6). "A vara e a disciplina dão
sabedoria, mas a criança entregue a si mesma vem a envergonhar a sua mãe"
(Pv 29.15). A severidade tem de ser utilizada nos primeiros anos de uma
criança, antes que a idade e a obstinação endureçam-na contra o temor e a
pungência da correção. Poupe a vara e você arruinará seu filho; não a utilize e
terá de sofrer as consequências.
É quase desnecessário salientar que as Escrituras citadas anteriormente
não têm o propósito de incutirmos a ideia de que nosso lar deve ser
caracterizado por um reino de terror. Os filhos podem ser governados e
disciplinados de tal maneira, que não percam o respeito e as afeições por seus
pais. Estejamos atentos para não estragarmos seus temperamentos, por fazermos
exigências ilógicas, e provocá-los à ira, por castigá-los expressando nossa
própria ira. O pai tem de punir um filho desobediente não porque ficou bravo, e
sim porque é correto fazer isso, Deus o exige, bem como a rebeldia de seu
filho. Nunca faça uma ameaça, se não tenciona cumpri-la. Lembre que estar bem
informado é bom para seu filho, mas ser bem controlado é ainda melhor.
Esteja atento às inconscientes influências que cercam seu filho. Estude
meios para tornar seu lar atraente, não pela utilização de recursos carnais e
mundanos, mas por servir- se de ideais nobres, por incutir-lhes um espírito de
altruísmo e desenvolver uma comunhão agradável e feliz. Não permita que seus
filhos se associem a más companhias. Verifique cautelosamente as revistas e
livros que entram em seu lar, observe os amigos que ocasionalmente seus filhos
convidam para vir ao lar e as amizades que eles estabelecem. Antes mesmo de o
reconhecerem, muitos pais permitem seus filhos relacionarem-se com pessoas que
arruínam a autoridade paternal, transtornam seus ideais e semeiam frivolidade e
pecado.
Ore por seus filhos
Quarto, o último e mais importante dever, no que se refere ao
bem-estar físico e espiritual de seus filhos, é a intensa súplica a Deus em
favor deles. Sem isto, todos os outros deveres são ineficazes. Os meios são
inúteis, exceto quando o Senhor os abençoa. O trono da graça tem de ser
fervorosamente buscado, para que sejam coroados de sucesso os nossos esforços
em educar os filhos para a glória de Deus. É verdade que precisa haver uma
humilde submissão à soberana vontade de Deus, um prostrar-se ante a verdade da
eleição. Por outro lado, o privilégio da fé consiste em apropriar-se das
promessas divinas e em recordar que a ardente e eficaz oração de um justo
produz muitos resultados. A Bíblia nos diz que o piedoso Jó "chamava...a
seus filhos e os santificava; levantava-se de madrugada e oferecia holocaustos
segundo o número de todos eles" (Jó 1.5). Uma atmosfera de oração deve
permear o lar e ser respirada por todos os que dele compartilham.
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